quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Nina



A idéia de envelhecer ao lado da pessoa que amo me emociona bastante.
Sempre pensei no amor assim, e tive o privilégio de assistir a uma bela história de amor.
Minha tia-avó, Nina, foi uma das pessoas mais doces que conheci. Sua casa vivia cheia dos muitos filhos, netos e sobrinhos que tivera. Sua delicadeza se estendia a todos que sua voz baixinha e suave tocava.
Era uma mulher pequena, frágil, sincera. Ouvia muito e falava pouco, mas com serena firmeza.
Pelas suas mãos, morangos, flores, quadros e filhos nasceram e enfeitaram sua vida.
Havia também o grande viveiro de pássaros no quintal, onde toda manhã ela entrava para matar a fome de alimento e de sua presença que os bichinhos, em festa, saudavam.
Até Sheik, o pastor alemão, que vivia no fundo do imenso quintal e cuja fama aterrorizou minha infância, comia na mão dela os pedacinhos de pão que lhe foram reservados do café da manhã.
Madrinha Nina, na verdade madrinha da minha mãe, mas chamada assim de empréstimo por mim, foi quem me contou que "toda mocinha recebe um presente mês a mês e por causa dele, um dia pode ter bebês que vão ser sua alegria para sempre".
Morava em Belém quando soube da sua morte. Não chorei. Li a carta que me trouxe a notícia com calma e serenidade. Acho que fui tomada pela sua presença, pelo seu espírito que acreditava em ciclos e passagens.
Madrinha Nina se foi como viveu: sem alvoroço, em paz. Com a cabeça pousada sobre as pernas do seu marido e companheiro.
Não sei por que só pude chorar sua ida agora, quase vinte anos depois. Talvez eu tenha perdido um pouco da doçura que aprendi com ela. Ou agora que sou mãe como ela tão feliz o foi, pude sentir que plantar morangos e flores, pintar quadros e parir filhos pode ser aquilo que damos o nome de felicidade.

Kenia Mello

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