sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Faltas



Tem dias em que acordo sem sobressaltos, achando que a vida finalmente segue em linha reta e que ela deve ser preenchida por almoços de domingo, árvores de Natal e uma boa dose de paciência. Ah, sim, e com alguma clareza e poucos vacilos porque os mesmos e velhos erros não serão mais convidados para o jantar. Confesso que, apesar de falsa, essa sensação me conforta, alinha meu dia e me dá fôlego suficiente para levantar.

Mas em muitos outros, sinto, na pele e ao meu redor, os buracos deixados por pequenas e grandes faltas.

E sinto tanto, de maneira quase sempre sufocante, aguda e insistente, coisas que eu sequer suspeitava que um dia viessem a me fazer falta.

Sinto falta de uma certa casa, numa certa rua da minha infância. Sei que ela não existe mais, mas seus ruídos, seus cheiros e quem nela habitava ainda e sempre morarão em mim.

Sinto falta de alguns abraços, sorrisos e rostos que não verei mais, mas que me buscam, por mais que os dias passem e seus contornos estejam se apagando na minha memória.

Sinto falta de alguns objetos que fizeram parte da minha história e se perderam em mudanças, descuidos e fundos de gaveta. Sou capaz de tocá-los mais pelas lembranças que evocam do que por suas formas e texturas.

Sinto falta do cheiro de bebê da minha filha, da sua risada e fala hoje tão modificados.

Sinto falta do passado, de verdade. Nostalgia, saudade, qualquer que seja o nome. Esses pedaços que saíram fisicamente de mim, começo agora a percebê-los, a recolhê-los e arrumá-los. E principalmente a entender que nada parte ou se parte, tudo vai porque não se faz mais necessário: já está ou sempre esteve. Há uma certa paz nisso e eu desconfio que a vida sabe oferecer compensações. O caminho comprido é entender como.

12 comentários:

Anônimo disse...

acho q só conseguimos a saciedade emocional mesmo qdo conseguimos tirar tudo de dentro de nós.Aí somos mais inteiros pros outros e pra vida.
Lindo texto,poesia em prosa q amo!

Bjos e []s e um ótimo fds!

Ivette Góis

Giovanni Gouveia disse...

Uma das melhores definições de saudade que já li...

schstri

Anônimo disse...

Kenia, que linda essa sua maneira de escrever sobre coisas que a gente sente mas não sabe por em palavras.
Obrigada por me dar esperança de que um dia a saudade q sento não vai pesar tanto...

Marco Yamamoto disse...

Acho que estamos atravessando a mesma fase. Eu também ando sentindo falta de muitas pessoas, muitas cenas e muitas coisas do passado que não podem mais ser vistas ou sentidas novamente.

Beth/Lilás disse...

Kenia, querida!
Tem duas pessoas nesta Net que quando escrevem sério me tira lágrimas. Você é uma delas.
Amo sua maneira direta e poética de escrever e mostrar a vida.
beijo carioca

Lucard disse...

Tô sem palavras hoje. Mas tinha que comentar. Ou pelo menos escrivinhar.
Beijosssssssssss

PS: Tô feliz por demais, meu porjeto pro festival de teatro aqui em Garanhuns foi aprovado pelo BNB.

Anônimo disse...

SE EU PUDESSE - Fernando Pessoa

Se eu pudesse, trincar a terra toda, e sentir-lhe uma paladar,
Seria mais feliz um momento. Mas nem sempre eu quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz, para se poder ser natural...

Nem tudo é dias de sol, e a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade como a felicidade. Naturalmente, como que não estranha que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva...

O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade
Sentir como que olha
Pensar como quem anda
E quando se vai morrer, lembra-se que o dia morre
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja...

Beijos Kenia, estou com sintomas não sei de que....

Sweet! disse...

Ô, colega, e eu tô sentindo falta dos bofes, num sabe?

Posso não ser das pessoas + adequadas para dizer isso (porque tem dias q, afe), mas:
bota prá subir, Kênia!

Xêro!

Kenia Mello disse...

Fatinha, lembrei dessa música de Marisa:

Eu só quero que você saiba
Que estou pensando em você
Agora e sempre mais
Eu só quero que você ouça
A canção que eu fiz pra dizer
Que eu te adoro cada vez mais
E que eu te quero sempre em paz

Tô com sintomas de saudade
Tô pensando em você
E como eu te quero tanto bem
Aonde for não quero dor
Eu tomo conta de você
Mas te quero livre também
Como o tempo vai e o vento vem

Eu só quero que você caiba
No meu colo
Porque eu te adoro cada vez mais
Eu só quero que você siga
Para onde quiser
Que eu não vou ficar muito atrás

Tô com sintomas de saudade
Tô pensando em você
E como eu te quero tanto bem
Aonde for não quero dor
Eu tomo conta de você
Mas te quero livre também
Como o tempo vai e o vento vem

Eu só quero que você saiba
Que estou pensando em você
Mas te quero livre também
Como o tempo vai e o vento vem
E que eu te quero livre também
Como o tempo vai e o vento vem


Beijos, querida.

Kenia Mello disse...

Queridos, obrigada. Eu gosto tanto quando vocês dizem que gostam. :)

Marco, pois peguemos metros de Kleenex e baldes porque o vale é de lágrimas. :)

Esperança, parabénnnnnnsssss!

Sweet, Betty Faria volta pra função na segunda, de acordo com o que a própria me disse. ;)

Anônimo disse...

Tive uma saudade assim quando estive no Brasil este ano. Via meu passado no presente: o cheiro de pão vindo da padaria, as novelas, as notícias na tv, a maneira como minha tinha nos chamava na porta.

Abração pra você!

Anônimo disse...

Ousando completar os finalmentes...
E nem sempre entender tb faz parte!
bj
R.