quinta-feira, 28 de julho de 2011

Eu, a feira e o homem do queijo



Vivendo na Holanda, readquiri um costume que me acompanhou a infância toda, mas que desapareceu na vida adulta: ir à feira. Cresci indo à feira com a minha vó, e não se tratava de qualquer feira, não: era a Feira de Caruaru, moral. A maior feira ao ar livre do mundo, dizem as lendas greco-romanas (ai, como estou espirituosa!). Pois bem, todo sábado cedinho, íamos eu, D. Nau e mais alguma outra pessoa, que podia ser meu avô ou uma das moças que trabalhava lá em casa.

Foto da Feira de Caruaru no tempo da minha narrativa (década de 70):



Imagem deste século:



Aqui, além das feiras grandes em Amsterdam, nas quais vamos mais pra assuntar e comprar besteira do que fazer o rancho propriamente dito, tem uma feira na nossa área, Diemen Centrum, todas as quartas e não é o dia todo, apenas na parte da manhã, o que nos limita bastante porque nesse horário, estou no curso e Paul, no trabalho. De modo que nos sobram os sábados de manhã, nos quais apenas as barracas de frutas e verduras, de pães e biscoitos e de queijos e ovos abrem.

Feira sempre é uma coisa legal, aquela muvuca básica, produtos bons e bonitos e, quase sempre, mais baratos do que nos supermercados. Coisas fresquinhas saídas das fazendas. Neste ponto, as feiras holandesas, não aquelas muvucosas das grandes cidades, mas as pequenas, que não são pra turista ver, são as melhores:



Devo confessar que fico apenas no apoio (leia-se segurando as sacolas), enquanto Paul vai pra fila e faz os pedidos nas barracas. Sim, porque depois do curso, já me sinto mais à vontade para não precisar a toda hora, quando falam comigo na rua, pedir desculpas em inglês e dizer que não falo holandês. Agora, já não me intimido e digo que se a pessoa falar mais devagar, eu posso entender. Mas na feira, meus caros e caras, a coisa muda de figura! Especialmente no trailer dos queijos e ovos: o boer (fazendeiro) é uma figuraça! Fala pelos cotovelos e, gente, com um sotaque que escapa do meu nível de entendimento. E ele é simpático, adora puxar papo com os fregueses, e não basta apenas escolher, pagar e pegar. Ele conversa, ri, faz piada, pergunta, responde antes de você conseguir piscar, ou seja, eu só não faço xixi nas calças quando estou nas proximidades porque fico de costas, evitando estabelecer contato visual com a criatura, olhando as outras coisas enquanto Paul pega queijo e ovos.



De acordo com a bur(R)ocracia holandesa, eu devo mais um exame de língua holandesa para o governo daqui a três anos, mas, vou falar, no dia em que eu conseguir falar com o homem do queijo, entender o que ele diz e ainda me fazer compreender, me dou por satisfeita.



9 comentários:

Alexandre Luna disse...

Figuras folclóricas, fazendo voce sentir-se local ou estrangeiro desde o início dos tempos! Aposto que antes da prova voce já estará trocando idéias com esse cidadão :)

Anônimo disse...

Imagino a cena com o homem do queijo, deve falar bem rápido, né? O pessoal do campo e do interior sempre tem o sotaque diferente, aqui no Brasil é o mesmo, vai falar com um cabôclo do sertão nordestino pra ver se vc consegue entender especialmente qdo ele falar rápido... rsrsrs
Mas em breve você estará de papo com ele, vc vai ver.

Bjos e []s

Ivette Góis

S. W disse...

Kenia aqui em Den Haag tem o Haagse Market que é uma feira de rua, todo dia, maravilhosa. Dá pra achar tudo, uma delicia de andar e ouvir todos os sotaques do mundo, barraca de cada canto do globo e tem o "homi" do queijo também. Da ultima vez comprei pra levar pros meus pais, ele me reconheceu depois e perguntou se eles tinham gostado hahahaha

beijao

Kenia Mello disse...

Alexandre, assim espero, mesmo porque tenho evitado falar inglês na rua e isso tem ajudado, me dado mais segurança. O lance lá com o homem é mais pantim mesmo. ;)

Ivette, o homem fala rápido que é uma beleza. :)
Beijos.

Simone, na feira daqui, dá pra escutar sotaques de todas as fazendas da região. :)
Beijos.

Anônimo disse...

Kênia,
Continuo lendo você sempre, embora comente pouco. Adorei ler a palavra pantim, principalmente porque ainda hoje escutei "é um pantinho...".
Sábado passado eu fui reler seu post sobre a Amy, porquanto foi em seu blog onde achei, sobre ela, o sentimento que mais se proximou do meu. Abraço. Vera.

Anônimo disse...

Eita, Kênia, a pressa me fêz engolir o a de aproximou. A compaixão (com-paixão), que nem é pena ou piedade, pela vida e arte despediçadas dessa menina, me constrangeu.
Ah, feira é flagrante de vida. Adoro pôr um lenço nos cabelos e ir a elas.
Vera.

Alexandre disse...

Oi Kênia.

Interessante, não imaginei que houvesse feiras na Holanda.Pelo menos,não num padrão tão similar ao nosso Mercado de São José,por exemplo.
Talvez o problema para entender o homem do queijo não seja a rapidez como ele fala,mas a forma(expressões populares, abreviações de palavras,etc.).Quando você se ambientar mais, e conhecer as gírias,etc. seu desafio vai ser não esquecer o Português.
Uma pena que a feira de Caruaru tenha sido descaracterizada.Virou uma espécie de mercado público,dentro ou próximo à feira da sulanca (assim disseram-me). Fiquei triste e até revoltado ao saber disso.
Essa foto reporta-me àquele tempo em que ia à feira com papai e fazia a minha feirinha: pitomba,laranja cravo,azeitonas pretas(doces),imbu,siriguela, sapoti, jabuticaba, pistolas e cachimbos de alfinim, doces (de jaca,batata doce, amendoim,goiaba com côco ), claro que alguns itens por vez. Mas a parada obrigatória era para saborear o caldo- de- cana com gelo e limão galego,acompanhado do “bolo de bacia” feito no dia e de aroma inconfundível.
Nessa foto,corrija-me se estiver errado,dá pra ver na parte superior,da direita para a esquerda: a cúpula da Matriz (na época a Igreja nova), o prédio da livraria Estudantil (estou em dúvida), e, ao fundo, o Morro do Bom Jesus.

Um abraço.

KS Nei disse...

o interessate de ser brasileiro é ter o regionalismo mais exacerbado lá longe. quando a gente muda pra um pais menor, muito menor, o regionalismo se limita a 50 km. aqui é assim.

Kenia Mello disse...

Oi, Vera, agora fiquei curiosa: você deve ter lido algo que eu postei sobre AW não aqui, mas no Facebook, né? Porque, por aqui, apenas um post bem antigo, quando ela ganhou os trocentos Emy's. :)
Beijão.

Isso mesmo, Alexandre, suas lembranças estão corretas sobre a nossa Caruaru. Sobre a feira, agora deslocada para perto da Casa de Cultura José Condé, não digo que tenha ficado ruim, pois no antigo local deixaria o trânsito daquela região ainda mais caótico. Estive no não tão novo local diversas vezes e, a bem da verdade, está mais voltada pro turismo mesmo, especialmente a parte do artesanato e das confecções. Já a parte da venda de alimentos conserva um pouco a essência, pois só "os locais" frequentam.
Sobre aqui, as feiras livres são muito comuns na Europa como um todo.
Beijos.

Nei, acho que se exacerba pra gente não esquecer de onde veio, né? ;)